POR REGINALDO GUERRA
Nesta semana, o Brasil alcançou um número que chama atenção e gera reflexões profundas sobre a realidade social do país: 94 milhões de pessoas estão cadastradas e recebendo apoio do Bolsa Família e de outros programas sociais. O dado representa quase metade da população brasileira, estimada em 203 milhões, segundo o IBGE.
Embora o marco seja apresentado como um sinal da abrangência das políticas públicas de combate à pobreza, ele também levanta um alerta: como um país que figura entre as maiores economias do mundo pode ter tamanha parcela de sua população dependendo de recursos federais para garantir o básico, como três refeições por dia?
A importância dos programas sociais
O Bolsa Família, criado em 2003 e reformulado em diferentes gestões, consolidou-se como um instrumento essencial para o enfrentamento da fome e da miséria. Ele garante uma renda mínima a famílias em situação de vulnerabilidade, muitas vezes representando a única forma de acesso à alimentação regular, saúde e educação.
Especialistas em políticas sociais reconhecem que, sem essa rede de proteção, os índices de fome e pobreza extrema seriam ainda mais graves. O programa, portanto, é vital no curto prazo, garantindo a sobrevivência de milhões de brasileiros que vivem à margem da economia formal.
O dilema da dependência
Apesar de sua relevância, os números revelam uma realidade preocupante: o Brasil não conseguiu, ao longo das últimas décadas, transformar a proteção social em trampolim para a inclusão produtiva e econômica. Em vez de redução, o que se vê é uma expansão contínua do número de beneficiários, sugerindo que o crescimento econômico ainda não chegou à maioria da população.
Economistas apontam que a dependência prolongada de programas sociais é reflexo da falta de geração de empregos de qualidade, da baixa escolaridade, da informalidade e da desigualdade estrutural que marca o país. O dado de 94 milhões de beneficiários mostra que a pobreza, em vez de diminuir, está se consolidando como um desafio crônico.
O papel do governo atual
O governo federal comemora a ampliação da cobertura dos programas sociais como um avanço na proteção das famílias mais vulneráveis. Entretanto, críticos questionam: se quase metade da população precisa de auxílio para viver com dignidade, podemos dizer que o país está bem economicamente?
A resposta, para muitos analistas, é não. O sucesso de um governo não pode ser medido apenas pela capacidade de pagar benefícios, mas sim pela habilidade de criar condições para que as pessoas deixem de precisar deles.
O futuro: assistência ou autonomia?
O grande desafio para o Brasil é equilibrar a manutenção da rede de proteção com políticas eficazes de geração de emprego e renda. Investimentos em educação, capacitação profissional, estímulo ao empreendedorismo e fortalecimento da economia produtiva são apontados como caminhos para romper o ciclo da dependência.
“Um país não pode se orgulhar de ter metade da sua população em programas sociais. O verdadeiro avanço virá quando os brasileiros não precisarem mais desse auxílio para garantir dignidade e qualidade de vida”, avalia um pesquisador de políticas públicas.
O marco de 94 milhões de beneficiários mostra duas faces do Brasil atual: de um lado, um governo que consegue atender as necessidades imediatas da população mais vulnerável; de outro, uma economia que ainda falha em gerar oportunidades para que esses cidadãos construam sua autonomia.
Enquanto não houver uma transição estruturada da assistência social para a inclusão produtiva, o país continuará refém de números que, mais do que motivo de comemoração, revelam um retrato doloroso da desigualdade brasileira.